"words are poisoned darts of pleasure" FF

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Aspira(dor)

O Tamanduá-bandeira tem apetite para formigas e nasceu com um aspirador; uma dessas maravilhas da natureza, milagre da especialização. Gosta de formigas, caça formigas, aspira formigas – está satisfeito. Sem essa baboseira de ter apetite pra tudo, de querer sugar para si todos os sonhos do mundo. Somos anatomicamente incompatíveis com esse desejo. Quisera eu, uma pelagem cinza com imponente listra preta, um formato assustador e vontade de formigas apenas; formigas e só. Eu aspiro, aspiro, aspiro e só expiro pó.

*pra continuar no mundo animal, mais um exercício para a oficina. Tínhamos que versar sobre um objeto, uma fruta ou um animal - metaforizando ou não.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Amor Animal

No último natal Alice decidiu que não queria um presente convencional. Gato, cachorro e passarinho ela não queria mais. “Nada de bicho normal”, disse ao namorado, que pôs-se a procurar tal animal. “Furões se afogam na privada”, avisou um amigo do trabalho, “e tartaruga só fica presa no aquário”, emendou uma prima da namorada. Restando ao prestativo João dar uma cobra píton de presente à amada.

Dizem que o namoro desandou por culpa do bebê píton, batizado por Alice de Edgar. Parece que João não gostou de ver uma cobra em seu lugar. No início tudo bem, Edgar era pequenino. “Só um metrinho”. Mas um ano e três metros depois o quarto e sala ficou pequeno demais para os dois. Alice nem ligou, Edgar era melhor companhia, comia os ratos que lhe eram dados e não reclamava que a comida estava fria.

Mas como em todo relacionamento, a crise não tardou a chegar. “Alôu, é do veterinário?”. “Sim, senhora, pode falar”. “Minha cobra está deprimida, acho que quer se matar”. “Olha, moça, a senhora vai ter que elaborar”. Alice explicou que não sabia o que tinha o pobre Edgar. Estava prostrado, não sabia o que havia de errado. Não comia e acordava todo dia ao seu lado, com o olhar desolado.

“Dona Alice, presta atenção”, disse o veterinário, soando preocupado, “Edgar precisa ser sacrificado”. “Nem morta”, respondeu Alice, pondo-se a chorar. “No meu Edgar é que o senhor não vai encostar”. Meio sem jeito, o veterinário tomou fôlego e bradou, sem hesitar:

“Dona Alice, essa píton quer te jantar”.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Hemisférios II

Escuta, do norte pro sul só o que muda é a cor:
sai o cinza, entra o azul – mas é igual a dor.
(esquece essa baboseira de choque cultural
só porque caiu um pouco de neve no natal)

Uma hora estás aflito de saudades do calor
e na outra faz à neve mil juras de amor.
(aposto que se tivesse se mudado pro Nepal
estaria a reclamar que o calor de lá é letal)

Entende de uma vez: saudade é uma maldição.
Finge que vai minguando e que vai desaparecer
e volta com invejável facilidade de adaptação.

Conforme-se: pra esse mal ainda não há solução.
Só nos resta aceitar, recostar e assisti-la crescer.
Claro que se acabar de beber também é uma opção.

(da série: enlouquecendo com a escansão. estava devendo esse exercício pro Paulo, aí transformei esse poeminha em um soneto. doeu, mas saiu).

segunda-feira, 4 de maio de 2009

I love you is really a question

Eu te amo
na verdade
é uma pergunta.

Verdade! Diga
eu te amo
e aguarde...

Tudo faz sentido
se ele responde
'Eu te amo'

(e você vê sinceridade)

Eu te amo
na verdade
é uma indagação.

(e aí reside a perversidade)

Eu te amo
na verdade
é uma intimação.

*exercício de repetição pra aula do Paulo; não ia postar porque não tinha gostado muito, mas como as pessoas gostaram...