"words are poisoned darts of pleasure" FF

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

distraídos

No Starbucks do Shopping Leblon os elevadores panorâmicos apostam corrida e as crianças correm em círculos. Observo a movimentação e me pergunto se algum dia vou conseguir ler duas páginas em paz, sem me emocionar com a passagem do tempo. TPM mais lua cheia é hit combo de tristeza sem porquê.

***

A luz fria pisca insistentemente e a voz do palestrante vai se diluindo na vertigem que esse strobo acadêmico me causa. Pistas de dança, auditórios — everything is version of something else. Lá embriaga-se de vodka, aqui de café. Na balada, o breu. Aqui o excesso de luz cega. No banheiro da boate vomitamos bebida. No seminário regurgitamos palavras.

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

ânsia

Tenho vontade de
mastigar devagarzinho
(mastigar e vomitar
até o último pedacinho)
esse olhar de 'pena, coitadinha'
que me lançam sempre
que saio pra jantar sozinha

quinta-feira, 13 de maio de 2010

gripal

Gosto muito de colocar papel pra tomar chuva
da fragilidade da tinta que desmancha
da palavra que desaparece
e eu ali, sumindo junto.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

de pijamas numa sexta à tarde

No fundo, todo mundo sabe

que a vida aos vinte e poucos

ou nos faz totalmente loucos

ou aponta o rumo que nos cabe.


Complicado, mesmo, é fechar os olhos e enfiar o pé na jaca.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Relógios meus

Na infância me coçavam e eram logo arrancados, abandonados num canto qualquer e decerto perdidos, para desgosto de mamãe. Um outro esqueci de propósito na banheira de um amante, desta vez para desgosto meu: o romance não durou nem um instante. Na antiga casa, nunca andou; não existiu mais do que a marca que na parede da cozinha ficou. Agora, na casa nova, jaz morto sobre a mesa o novo modelo – esqueci de pendurar.


Tic tac, mesmo, só o da morte a espreitar.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Autobiografia de uma caneca

A julgar pelo estado em que chegaram à juventude minhas bonecas, já era de se esperar que, adulta, colocasse também em risco a integridade física de minhas canecas. Ainda assim, nem a mais frágil das louças imaginaria tamanha efemeridade. Foram quatro horas, um passeio pela Paulista e um fim trágico – de um banco de bar para a eternidade.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

Aspira(dor)

O Tamanduá-bandeira tem apetite para formigas e nasceu com um aspirador; uma dessas maravilhas da natureza, milagre da especialização. Gosta de formigas, caça formigas, aspira formigas – está satisfeito. Sem essa baboseira de ter apetite pra tudo, de querer sugar para si todos os sonhos do mundo. Somos anatomicamente incompatíveis com esse desejo. Quisera eu, uma pelagem cinza com imponente listra preta, um formato assustador e vontade de formigas apenas; formigas e só. Eu aspiro, aspiro, aspiro e só expiro pó.

*pra continuar no mundo animal, mais um exercício para a oficina. Tínhamos que versar sobre um objeto, uma fruta ou um animal - metaforizando ou não.